Influenciadores dentro e fora de campo

Recentemente, Neymar e Gabriel Medina usaram as redes sociais para se comunicar com o presidente Jair Bolsonaro, que, em vídeo publicado no Twitter, convidara os dois atletas para visitar Israel. Deixando de lado a peculiaridade de tal situação, vamos nos atentar ao meio, e não à mensagem.

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Gabriel Medina, Neymar e Jair Bolsonaro. Fonte: AGNews; Twitter

A influência de esportistas, em especial dos jogadores de futebol, tem migrado cada vez mais para fora das quatro linhas. Acaba o jogo, e os atletas continuam em evidência no Facebook, Instagram, Twitter e qualquer nova rede que venha a surgir. Disso decorre também que os proventos recebidos por um jogador de futebol de alto nível podem ser complementados por sua visibilidade nas redes, na forma de patrocínios e parcerias.

Mesmo os salários pagos e os valores investidos pelos clubes em suas novas contratações levam em conta os aumentos esperados em vendagens de produtos licenciados e no engajamento dos fãs nas redes sociais, para além, é claro, de resultados dentro de campo. Se o heroísmo era um valor relevante até fins do século passado, hoje são outras as características decisivas que tornam um atleta o ídolo de um clube. Obviamente, os aspectos clássicos do herói continuam preponderantes, mas o marketing extracampo ocupa papel de cada vez maior relevo.

Estamos vendo uma reconfiguração do cenário esportivo na velocidade dos novos media. Não é um processo totalmente novo, posto que outrora já podíamos identificar a influência dos meios de comunicação no esporte e na formação de ídolos esportivos. No entanto, o processo atual afeta mais diretamente a carreira dos atletas, para o bem e para o mal. Visitar os perfis do Instagram de Messi, Cristiano Ronaldo, Phelippe Coutinho, Neymar e outros craques é um exercício também antropológico, pois nesses espaços estão registradas as aspirações de uma geração e os comportamentos inspiradores de toda uma comunidade (global). Vivemos um momento em que o futebol cada vez incorpora lógicas do capitalismo, e este se aproveita das idiossincrasias do esporte para alavancar ainda mais todo um setor produtivo e de consumo atrelado ao campo esportivo.

Juntos, os 57 convocados[1] para a Seleção Brasileira desde 2016 somam aproximadamente 332 milhões, 740 mil e 900 seguidores no Instagram, com destaque para Neymar, Marcelo, Daniel Alves e Philippe Coutinho, que possuem respectivamente 113 milhões, 36,8 milhões, 23,8 milhões e 19,2 milhões. São dados significativos e que dimensionam a influência de cada uma dessas personalidades. Para o mercado publicitário, entretanto, influência não significa necessariamente produção de conteúdo de qualidade sobre uma marca. Recentemente, escutei no podcast Código Aberto o gerente de mídias sociais do Bradesco afirmar que o banco trata os influenciadores como “produtores de conteúdo”, visto que sua empresa não paga por simples posts de endosso, no estilo do merchandising, mas por um conteúdo criativo elaborado especialmente para a parceria. É possível inferir que boa parte do conteúdo postado por esses atletas seja filtrada por um profissional ou uma equipe de comunicação. Suas reputações on-line formam parte do capital social desses jogadores enquanto indivíduos. A exigência sobre suas atuações não mais se restringe ao campo de jogo. É necessário que estejam preparados também para desempenhar o papel que é deles esperado por seus patrocinadores e fãs.

Ainda não detenho dados qualitativos que me permitam tecer mais do que algumas breves considerações sobre esse cenário, mas me comprometo a retornar ao assunto tão logo inicie uma investigação mais aprofundada sobre o tema. Acredito que analisar os discursos e as interações mercadológicas acionadas pelos atletas em suas redes sociais podem nos dizer muito não apenas sobre o futebol atual, como também sobre as relações capitalistas e sobre as mutações socioculturais em andamento na contemporaneidade.

 

[1] Apenas 5 deles não possuem conta ou desativaram seus perfis no Instagram.

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