O Nordeste merece respeito!

Fonte: @choquei

Quem escreve este texto é um dos “carrapatos” nordestinos que votaram em Luiz Inácio Lula da Silva. O motivo? (Também) Contra todo o ódio a grupos sociais específicos e historicamente subalternizados e a quem ensina, faz pesquisa e constrói extensão com a sociedade.

Sou alguém que se enquadra na bifiliação clubística pelos efeitos da difusão midiática dos clubes de Rio de Janeiro e São Paulo, mas que não é flamenguista. Pesquiso justamente os efeitos disto em orientação de iniciação científica numa universidade federal para entender este cenário em Alagoas.

Indicado de onde eu parto, creio que não há clubismo algum em afirmar que a atual diretoria do Flamengo tem membros que não só se posicionam individualmente como apoiadores do atual presidente da República, como não esconde a vontade de disponibilizar o clube de maior torcida do Brasil para isso.

Um simples exemplo sobre isso, até para não ficar cansativo, é o fato de no dia da votação do segundo turno das eleições houve a opção por encontrá-lo, alguém também não flamenguista, para tirar fotos com a taça do tricampeonato da Libertadores – coisa que a torcida não poderia fazer naquele dia.

O compartilhamento de uma frase xenofóbica pela diretora de Responsabilidade Social Ângela Machado contra nós do Nordeste, mesmo ela sendo nordestina, portanto, não é surpresa.

Tudo bem, penso que se fizer um levantamento entre dirigentes de outros clubes, não deva ser tão diferente o posicionamento eleitoral no segundo turno. Para ficar no Nordeste e em clube que torço, o atual presidente do CSA mesmo, Omar Coelho, é apoiador do presidente atual e tem dois perfis no Instagram para separar o cargo das opções individuais.

A questão é que o Flamengo, no que avalio ser o maior momento da história em títulos, tem uma diretoria que optou por estar vinculada a um grupo político-ideológico, usando o clube para demonstrar isso. O mesmo Flamengo que se orgulha em ter uma torcida nacionalizada – e ganha dinheiro com isso.

Legenda: postagem compartilhada pela diretoria do CRF

“Ela tem o direito de se posicionar”

Foi com essa frase que, dias depois do posicionamento de Machado, o presidente do clube e marido da diretora, Rodolfo Landim, respondeu ao que ocorreu. Há um claro e evidente equívoco despejado todos os dias em mídias sociais que a liberdade de expressão seria um direito supremo, ou seja, que se pode falar/postar qualquer coisa porque é uma garantia constitucional.

Entretanto, crimes contra honra, que podem gerar danos financeiros ou morais, ou práticas expressas de preconceito como o racismo também estão estabelecidos em lei. Não há em qualquer modelo minimamente democrático indicação que se possa cometer crimes ou espalhar ódio a grupos sociais específicos sem sofrer a possibilidade de ação judicial e seus efeitos.

Diretoria de Responsabilidade Social

Isso ainda piora quando se trata de alguém que dirige a pasta de Responsabilidade Social, criada em 2019 pelo clube e com diversas e relevantes ações sociais realizadas desde então.

Conforme a descrição do trabalho dessa diretoria no site do Flamengo, com aproximadamente 42 milhões de torcedores no país, o clube seria “uma espécie de patrimônio cultural do Brasil” e, por isso, a gestão teria “o compromisso com o apoio à construção de uma sociedade mais justa e inclusiva”.

Vimos isso neste caso ou um desrespeito a milhões de possíveis torcedores do clube? Por que a diretoria do clube não se posicionou formalmente quanto à importância da região pelo menos enquanto torcedora?

Posicionamento dos clubes nordestinos

Falei do presidente atual do CSA, de posicionamento político-eleitoral igual ao da diretora rubro-negra, mas achei muito bom que o clube não tenha demorado a se posicionar: “O CSA repudia a declaração xenofóbica da Diretora de Responsabilidade Social do Flamengo. Sua fala foi uma agressão ao povo nordestino. O Nordeste merece respeito”.

CRB, Campinense, Caucaia, Confiança, Náutico, Sampaio Corrêa, Santa Cruz, Sport, Vitória e Sergipe – do que encontrei relatos –, também se posicionaram. Destaque para a raposa paraibana: “👊🏻 O nordestino não tem a parêa não. Pega o preconceito duzôto, mistura com picado de bode, farinha e come. Já o Urubu, carniça! #Campinense contra a Xenofobia”.

Provavelmente alguém, num país paralelo, vai dizer que houve “preconceito” aí, como vem sendo comum em respostas sobre ações no Nordeste quanto a torcedores de clubes de fora da região – ainda que eu tenha ponderações sobre a tática, já demonstradas em texto no Ludopédio.

Porque ainda tem isso: às vezes parece que a reação a um processo histórico de subordinação político-midiática-econômica, com efeitos direitos sobre o futebol, seria a grande violência e desrespeito.

“Não se trata de uma crítica a quem torce para o clube. Por sinal, um grupo rubro-negro carioca, o “Flamengo da Gente”, também se posicionou contra a fala da diretora de responsabilidade social do clube, exigindo posicionamento do Flamengo:
[…] O Flamengo é formado por uma torcida heterogênea. Somos gente de todas as partes do país e do mundo!
Somos as diferenças culturais que representam o Brasil real, aquele que o bolsonarismo odeia.
É inconcebível que Ângela Landim continue no Flamengo após uma manifestação xenofóbica. Sua saída precisa acontecer agora e a fala repudiada publicamente pelo Flamengo.
Viva o Nordeste!
Viva o Flamengo!
#ONordesteÉOFlamengo
#ForaAngelaLandim
Viva o Flamengo!”.

Considerações finais

É inadmissível do ponto de vista social e diria até que principalmente econômico que um fato como esse tenha ocorrido sem posicionamento formal da diretoria. O “carrapato” também consome e difunde a imagem do clube.

Fico pensando em como se sentiram os milhões de rubro-negros espalhados pelo Nordeste e que votaram no Lula com uma frase vinda de uma diretora do clube que amam e, pior, sem posicionamento claro do Flamengo sobre isso. O marketing vai de “AeroFla” na próxima viagem ao Nordeste e tudo resolvido, como se nada tivesse ocorrido?

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