No dia 26 de março deste ano, o Internacional, apesar da superioridade exercida durante a partida, acabou eliminado pelo Caxias nas semifinais do campeonato gaúcho de 2023 em pleno Beira-Rio. Com isso, o colorado completava sete anos longe do título estadual o que é muito tempo considerando que nos vinte e três campeonatos gaúchos disputados neste século, Grêmio e Internacional venceram vinte e dois. Imediatamente após converter a penalidade que classificava o time visitante, o atacante Wesley Pomba, formado nas categorias de base do rival – Grêmio, colocou as mãos nas orelhas como quem afirma não ouvir a torcida mandante. Deste gesto/provocação decorreu-se uma pancadaria generalizada entre os jogadores das duas equipes, incluindo, dentre outros, os experientes Alan Patrick, de 31, e Rodrigo Moledo, de 35 anos.
Em meio à confusão generalizada após eliminação do Inter, torcedor com criança de colo invade o campo para agredir jogador. Créditos: O Dia.
Não bastasse a cena recorrente e lamentável envolvendo o enfrentamento físico entre adversários ao final de uma partida eliminatória, tivemos uma cena que assustou os diferentes atores envolvidos com o futebol profissional jogado por homens no Brasil. Um homem de 33 anos, descrito nas reportagens como torcedor (penso em tantos adjetivos antes desse…) do Internacional entrou com uma criança de três anos no colo e agrediu um jogador do Caxias. A cena talvez não tenha ficado ainda pior porque os jogadores do Caxias ao pensarem em revidar a agressão viram a criança e recuaram. Para a sequência desse texto quero pensar se a ação desse homem (não quero chamá-lo de torcedor. Ele é um torcedor, mas antes de ser torcedor, nesse caso, ele é homem) foi algo absurdo, terrível, exógeno ao esporte e às práticas torcedoras ou se, ao contrário, foi uma ação que dialogou razoavelmente bem com algumas das normativas que circulam nesse esporte. Me refiro especialmente a duas delas: a paternidade e o “ódio eterno ao futebol moderno”.
Começo pelo “ódio eterno ao futebol moderno”. Esse slogan, movimento, iniciativa ou percepção goza de alguma simpatia dentre nós, acadêmicos e torcedores progressistas que militam contra a super mercantilização do futebol, chamado por alguns colegas de neoliberal. Ele carrega um importante movimento popular contra a elitização dos estádios de futebol, defende a festa e a tradição do que pode ser entendido como “cultura do futebol”. Por outro lado, parece possível afirmar que a defesa dessa “cultura do futebol” passa pela manutenção de outras formas de violência, dentre as quais o racismo, o machismo, a LGBTfobia… Esse “ódio” acaba dialogando bem com perspectivas mais conservadoras de nossa cultura que acham que o mundo está “chato” por não ser mais possível reproduzir impunemente preconceitos da mesma forma que eram realizados até a primeira década de nosso século.
Uma das críticas que seus interlocutores (talvez simpatizantes seja melhor por não conseguir enxergar um movimento organizado) realizam e que me captura é de que agora no futebol tudo é provocação. Não me refiro às violências nomeadas no parágrafo anterior, mas as faltas marcadas por dribles “excessivos”, cartões amarelos na comemoração dos gols e uma série de restrições que não se limitam às arquibancadas ou cadeiras de nossos estádios/arenas, mas que entram no campo de jogo. Se colocar as mãos atrás das orelhas pode produzir violência, o “futebol moderno” venceu, pois não aceita a provocação esportiva. Está na lógica de nossas trocas jocosas (GASTALDO, 2010) que ao vencedor é dado o direito de “gozar” o vencido, uma vez que esse lugar não é fixo e seja ele mesmo quem cria ou, no mínimo, reforça o ambiente agonístico do esporte. Provavelmente seja essa autorização a brincar que nos dá tanto medo de perder para nossos rivais para não sermos os “alvos” de suas brincadeiras.
O homem que invadiu o campo era sócio do clube e integrante de uma torcida organizada. As torcidas organizadas são um dos principais suportes do “ódio eterno ao futebol moderno”. Elas desejam a festa, as provocações e, também, a violência. Seria muito simples narrar uma contradição entre aqueles que acham que o mundo está chato, mas que não aceitam uma provocação esportiva. Talvez seja necessário pensar na normativa torcedora como algo que aceita esses dois textos, mesmo que contraditórios entre si. O potencial subversivo desse grupo de torcedores contra a hipermercantilização do futebol neoliberal é ignorado (ou, no mínimo, muito diminuído) quando o assunto é gênero. Me parece que o torcedor que invade o campo é contra a “chatice” do futebol moderno, mas também, como um homem bastante tradicional, não aceita sofrer um deboche, não pode permitir levar desaforo para casa.
Vamos ao segundo ponto: paternidade. Em meu último texto para esse blog, comentei como a desobrigação paterna parece uma constante nas narrativas sobre o futebol profissional jogado por homens. Ilustrei o argumento com as concentrações antecipadas para que os jogadores possam dormir, o anedótico caso do atacante (que seguia em negociações com o Internacional enquanto digito essas linhas) que fingiu uma lesão para não ser preso pelo não pagamento de pensão alimentícia e o orgulhoso torcedor que perdeu o nascimento e os primeiros dias de vida da filha não somente porque foi ao jogo no dia de seu nascimento como envolveu-se em uma briga e acabou preso.
O homem que invadiu o campo com a criança de colo está muito distante dessa perspectiva de paternidade? Ele seria um bom pai por levar sua filha ao estádio? A indignação com o resultado e a necessidade de recuperar a honra da derrota esportiva autorizam que a segurança da criança fosse colocada em risco? Eu tenho os ensaios de resposta, mas não tenho estômago para escrevê-los. Eu gostaria de corroborar a hipótese de tratar-se de uma ação que não faz parte do nosso futebol cotidiano, mas não consigo. No máximo eu conseguiria afirmar que o episódio não é um problema de torcedor, mas de homem, do gênero masculino. Eu me permito apostar que os torcedores de nossa cultura são melhores que os homens dessa mesma cultura, mas ainda existe uma aproximação muito grande. Talvez a única perspectiva para tentar enfrentar esses episódios violentos seja tentar “desmasculinizar” o futebol e o torcer. Infelizmente, para mim esse é um homem possível, um homem autorizado nesse esporte ainda tão androcentrado em suas produções discursivas.
Referências
GASTALDO, Edison. As relações jocosas futebolísticas: futebol, sociabilidade e conflito no Brasil. In: Mana, v. 16, 2010 p. 311-325.
O leitor e a leitora que acompanham meus textos já sabem que, por aqui, procuro sempre trazer algum assunto que relacione futebol, política e o panorama atual da nossa sociedade. Neste texto, trato especificamente do futebol de mulheres e da Copa do Mundo de futebol de mulheres que, em 2023, será realizada na Austrália e na Nova Zelândia. Desde 1991, a FIFA organiza uma Copa do Mundo de Futebol Feminino a cada quatro anos, mas nem sempre foi assim. Nesse sentido, vamos conversar um pouco sobre as proibições ao futebol de mulheres e de que maneira esse histórico se reflete nos campeonatos organizados para a categoria até os dias de hoje.
O futebol de mulheres foi proibido no Brasil pelo decreto nº 3.199 de 14 de abril de 1941. Este decreto não foi o primeiro cerceamento explícito ao futebol de mulheres no mundo, uma vez que vinte anos antes, a Federação Inglesa de Futebol (FA) já havia proposto um documento que estabelecia o banimento do futebol de mulheres e proibia sua prática nos campos e clubes dos times associados à federação. Contudo, mesmo com as proibições vigentes, as mulheres inglesas e brasileiras seguiram praticando o esporte, ainda que de maneira mais escondida.
Jornal no Museu do Futebol em SP. Reprodução.
Entretanto, sobretudo após a Segunda Guerra Mundial, o futebol de mulheres ganhou cada vez mais evidência ao redor do mundo, fazendo com que clubes e times se formassem para a prática do esporte. Na década de 1960, o banimento inglês foi revogado, e algumas federações, como a Federação Italiana de Futebol Feminino, foram criadas.
Essa federação, com o apoio e o patrocínio de alguns empresários que passaram a ver no futebol de mulheres uma fonte de público e renda, iniciou um projeto para criar uma “Copa do Mundo” de futebol de mulheres.[i] As duas edições, realizadas na Itália e no México em 1970 e 1971, respectivamente, chamaram a atenção da sociedade, da mídia e, claro, da FIFA. Esses torneios, que se intitulavam “Campeonatos mundiais femininos,” não eram reconhecidos, nem organizados pela FIFA, entidade máxima gestora do Futebol Association. Por isso, são chamadas de “Copas Clandestinas”.[ii]
A edição de 1970 foi sediada na Itália. Segundo reportagem do Jornal do Brasil, a cidade de Turim foi escolhida para sediar a final do campeonato por ser considerada o berço do futebol masculino italiano no final do século XIX. As outras partidas aconteceriam nas cidades de Nápoles, Palermo, Roma, Bolonha, Gênova e Milão.[iii] Ainda não foi possível confirmar se todas essas cidades efetivamente sediaram os jogos da Copa de 1970 – por falta de cobertura da imprensa –, mas há registros de que, na partida final disputada em Turim, a Itália foi derrotada pela Dinamarca pelo placar de 2×0.[iv]
A Copa de 1971, realizada no México, obteve uma maior cobertura das imprensas brasileira e mexicana – e foi o mundial feminino que mais chamou a atenção da FIFA. Jornais do México traziam reportagens de destaque sobre o evento no país. Em notícia intitulada “Copa del Mundo para Mujeres”[v], o jornal destacou o fim do banimento inglês, a realização de jogos entre selecionados da Grã-Bretanha e ainda a criação de uma Liga Inglesa de Futebol Feminino. A notícia ainda mencionava a criação da Copa do Mundo Feminina naquele ano. O interessante aqui é a ênfase dada à luta das mulheres – nesse caso, sobretudo as inglesas – para o reconhecimento e a validação da prática do futebol de mulheres, que vinha sendo praticado sob ares proibitivos havia décadas.
Copa Mundo Feminina ocorrida no México em 1971. Reprodução.
Em outra reportagem nomeada “La ‘fuerza’ de las italianas contra la técnica argentina”[vi], o periódico narrou a disputa pelo terceiro lugar, sediada na Cidade do México. É interessante observar que a nota efetivamente destacava qualidades técnicas de ambas as equipes e reproduzia o questionamento do técnico argentino quanto à arbitragem do mundial. Diferente do que acontecia em outras reportagens, esta não destacava os atributos físicos das jogadoras. A nota mencionava ainda a necessidade da apresentação de ingressos para a entrada no estádio e declarava que a partida seria disputada e interessante.
Na imprensa brasileira, a cobertura do mundial assumia ares um pouco distintos. Em notícia do Jornal dos Sports, lê-se que a segunda Copa agora seria organizada pela Federação Internacional de Futebol Feminino. De acordo com a mesma reportagem, “foi um torneio bem organizado, que os homens consideraram uma reação superentusiástica das mulheres à atuação dos astros como Pelé, Riva e Bobby Moore, que disputaram a última Copa do Mundo de futebol masculino no México”.[vii] É interessante perceber que, mesmo elogiando o campeonato organizado em 1970 e reconhecendo seu sucesso, o jornal, de certa maneira, menosprezava o interesse das mulheres em praticar futebol, associando a criação dos eventos a uma “reação entusiástica” à Copa masculina, realizada no México no ano anterior.
Em outra reportagem do Jornal dos Sports sobre o II Campeonato Mundial Feminino, o texto afirma que os mexicanos estavam se preparando com muito afinco para o campeonato e que lamentavam que o Brasil – considerado, segundo a notícia, o país com o melhor futebol de mundo – não participaria do evento. A reportagem terminava afirmando que os mexicanos “esperam que o Mundial de Futebol Feminino seja um sucesso sob o ponto de vista técnico, porque o êxito em termos de turismo já está praticamente garantido, já que muita gente quererá ver de perto se as garotas curvilíneas batem bem na bola como os marmanjos.”[viii]
A partir da reportagem citada acima, é possível reiterar o que já foi apontado em outros textos: os estereótipos baseados na feminilidade e a beleza que se espera das mulheres permanecem presentes nos discursos da imprensa e da sociedade, mesmo em locais onde a prática desse esporte é permitida – e mesmo durante um torneio. É interessante ressaltar que a reportagem não questiona se a expectativa de ter um grande público poderia ou não se basear na capacidade tática e técnica do jogo praticado. Pelo contrário: para o redator, a presença de público estaria garantida porque as meninas curvilíneas estariam em campo e iriam despertar a curiosidade do público para ver se sabiam ou não bater bem na bola.
Tais reportagens apresentam dois aspectos importantes. O primeiro diz respeito ao contraponto do tom adotado pela imprensa dos dois países – México e Brasil – acerca do campeonato. Enquanto a primeira destacava fatos sobre o evento, a segunda sempre ressaltava aspectos do corpo feminino – o que estava em acordo com o senso comum referente à prática do esporte no país à época: o futebol deveria ser praticado apenas por homens.
Copa Mundo Feminina ocorrida no México em 1971. Reprodução.
Além disso, é digno de nota que poucos jornais se preocuparam em referenciar os campeonatos femininos. No México, além do El Informador, o jornal Sol de México também apresentou algumas reportagens sobre as copas; enquanto no Brasil, em pesquisas feitas por mim, somente nas edições do Jornal dos Sports foi encontrada alguma referência sobre os eventos.
Um segundo ponto diz respeito ao destaque que o evento ganhou. É evidente que a Copa do Mundo FIFA de Futebol Masculino era um campeonato muito mais famoso e que recebia muito mais atenção da imprensa e do público mundial. Porém, é necessário ressaltar a atenção que um campeonato “clandestino” – ou seja, sem o aval da entidade gestora do futebol mundial – recebeu na imprensa internacional, inclusive de países nos quais a modalidade era proibida por lei, como no caso brasileiro.
As mudanças no caminho: Rumo às edições televisionadas
A FIFA assumiu as rédeas da organização e da gerência do futebol de mulheres no final dos anos 1980, quando a modalidade já havia sido liberada e regulamentada no Brasil. Em 1991, a China sediou a 1ª Copa do Mundo FIFA de Futebol Feminino, demarcando que, a partir dali, o controle do futebol de mulheres estaria nas mãos da entidade – e mais, desconsiderando os mundiais que tinham acontecido anteriormente, relegando-os à “clandestinidade”.
Como já foi apontado por mim em outros textos, a proibição da modalidade e toda tentativa de apagamento deixaram legados à prática desse esporte ainda hoje. Foi somente em 2019 que o Grupo Globo transmitiu, pela primeira vez, a Copa do Mundo de Futebol Feminino no Brasil. Nos anos subsequentes, o grupo passou a transmitir partidas de outros campeonatos, como campeonatos estaduais (mesmo que a grande maioria dos jogos tenha sido transmitida em canais por assinatura pertencentes ao grupo, e não na TV aberta).
2023, como foi dito, é ano de Copa do Mundo de Futebol Feminino. O evento, que será sediado na Austrália e na Nova Zelândia, acontecerá entre os meses de julho e agosto e será o primeiro a contar com 32 seleções e a adotar formato semelhante ao que vigorou até 2022 para o futebol masculino. Contudo, se compararmos ao futebol de homens – que mesmo com o mundial tendo sido realizado em novembro de 2022, já contava com reportagens e coberturas especiais desde o início do ano –, a mídia ainda está um pouco silenciosa em relação à cobertura do evento.
Neste ano, o Grupo Globo também irá transmitir um novo campeonato de futebol de mulheres: a Supercopa de Futebol Feminino. O torneio teve sua primeira edição em 2022 e, para este ano, já há confrontos e tabela liberada pela CBF. O campeonato se iniciou no dia 4 de fevereiro e inaugurou o calendário de transmissões de futebol feminino na Globo.
Final do Campeonato Brasileiro Feminino A-1 – Corinthians x Palmeiras. Créditos: Staff Images Woman/CBF. Reprodução.
Todavia, esse campeonato despertou comentários e indignação de mulheres envolvidas na modalidade por conta da premiação. A Supercopa Masculina deste ano teve a premiação de R$ 10 milhões para o campeão e de R$ 5 milhões para o vice-campeão – os maiores valores já pagos na competição. Para as mulheres, contudo, às vésperas do início da competição, a CBF ainda não tinha divulgado o valor dos prêmios. Como na edição de 2022 não houve prêmio, ocorreram muitos comentários e chacotas nas redes sociais.
Segundo reportagem de página esportiva, a técnica do Atlético Mineiro teria ironizado em suas redes sociais que a premiação da Supercopa Feminina seria “andar de ônibus”. Outra atleta também divulgou em suas redes que a premiação do ano passado havia sido “50 medalhas e 1 troféu”. O debate nas redes sociais tem se apresentado entre, de um lado, pessoas que defendem uma maior valorização do futebol feminino – inclusive, reivindicando premiações semelhantes às do masculino – e, de outro, aqueles que não veem sentido nas reclamações.
No fim das contas, foi divulgado um pagamento para o torneio no valor de 500 mil reais para o time vencedor e de 300 mil para o segundo colocado. Após as cobranças nas redes, a própria CBF divulgou a notícia sobre o valor da recompensa em sua página, chamando a premiação para o torneio de histórica.
Sem entrar no mérito do debate, acredito que, a partir do que foi exposto neste texto, podemos chegar a duas conclusões: a primeira e mais direta é que o futebol de mulheres ainda tem um caminho importante a percorrer no sentido da igualdade de condições e, também, de premiações. A segunda diz respeito à história do futebol de mulheres. A tentativa – inclusive fomentada pela FIFA – de apagamento de competições e práticas do futebol de mulheres, faz com que a modalidade perca ainda mais sua bagagem e credibilidade aos olhos de parcelas da sociedade. Alguns grupos apareceram em comentários de redes sociais – diante da demora da CBF em divulgar o valor da premiação – justificando o seu não pagamento. O principal argumento utilizado por eles era o de que o futebol de mulheres é recente e que ainda precisava se aprimorar e adquirir mais tempo de jogo para que a igualdade aconteça.
Isso, como sabemos, não é verdade: as mulheres praticam futebol no Brasil desde, pelo menos, o início do século XX e, apesar das dificuldades e proibições no país e no mundo, seguiram se dedicando ao esporte. A duras penas, elas conseguiram reconhecimento e a proposição de campeonatos que, a cada ano, se multiplicam e atraem cada vez mais público e renda. Qual seria, então, a justificativa para a demora na divulgação do valor, ou ainda, para o pagamento de um valor tão inferior – chamado de “histórico” – para a competição feminina? Essa, sim, é uma pergunta que deveria fomentar inúmeros debates e que, ao fim e ao cabo, reflete a discriminação de gênero presente de maneira geral nos esportes e, de maneira específica, no futebol.
A busca pela visibilidade e igualdade no futebol de mulheres é algo que precisa ser constante. Mesmo quando existe uma conquista, a dificuldade em obter igualdade de condições se apresenta. É somente com o conhecimento da história e da historicidade dessa modalidade, de suas proibições e permanências, que poderemos ampliar a luta por respeito e igualdade no futebol.
Notas
[i] “Turim vai ter em julho a primeira Copa do Mundo de futebol para as mulheres”. Jornal do Brasil. Rio de Janeiro, 12 de março de 1970, p. 22. [ii] “Mais uma”. Jornal dos Sports. Rio de Janeiro, 16 de julho de 1970, p. 2. [iii] O termo “Copa do Mundo” é usado aqui entre aspas pois o nome do campeonato está diretamente relacionado àqueles organizados pela FIFA. No caso das copas mencionadas, não é a entidade responsável pela organização.
[iv] Uso aqui o termo “Copas Clandestinas” como mencionado por Jean Williams, em seu livro que menciona os mundiais. Nos documentos da própria FIFA, o evento é referido como “Os assim chamados Campeonatos Mundiais femininos” (Tradução livre). Cf. WILLIAMS, Jean. Globalising Women’s football. Europe, Migration and profissionalization. Berna: Peter Lang AG, Internationaler Verlag der Wissenschaften, 2013.
[v]El Informador. Guadalajara, 3 de junho de 1971, p. 5.
[vi]El Informador. Guadalajara, 2 de setembro de 1971, p. 1. [vii] “Um futebol diferente”. Jornal dos Sports. Rio de Janeiro, 14 de julho de 1971, p. 2.
[viii] “Elas também dão no couro”. Jornal dos Sports. Rio de Janeiro, 19 de junho de 1971, p. 2.
Antes mesmo da posse, a ministra do Esporte, Ana Moser, deixou clara a prioridade da pasta, recriada após quatro anos: promover acesso universal e igualitário à prática esportiva. Após o ciclo encerrado de megaeventos no Brasil e de investimentos bilionários em um grupo seleto de atletas de ponta, o orçamento agora tem outro foco [1], pelos próximos quatro anos: o esporte na escola.
O objetivo é combater o sedentarismo, promover igualdade de gênero, reduzir a agressividade entre os alunos, promover sociabilidade entre os jovens e tirá-los da rota das drogas. Mas e se isso começasse justamente desmontando aquilo que mais simboliza a educação física, a típica quadra de futebol?
Pátio do colégio Nossa Senhora de La Paloma, em Madrid. Foto: Claudio Álvarez
Arquitetos verificaram como é positivo para o cotidiano escolar que as duas traves não sejam o centro das atenções de um pátio. Um estudo realizado por pesquisadores da Universidade de Viena [2] analisou o design e a estrutura de 20 áreas de recreação de escolas austríacas.
Os pesquisadores concluíram que os meninos ocupam o espaço do pátio com o futebol, enquanto as meninas permanecem em lugares periféricos, menores e realizavam atividades com menor gasto calórico. Nem a maior difusão do futebol feminino foi capaz ainda de mudar o apartheid entre os gêneros nas áreas de recreação, que são 80% “futebolcêntricas”, segundo a Equal Saree [3], organização não-governamental de arquitetura e urbanismo feminista na Espanha.
Para mudar esse cenário, as arquitetas da Equal Saree mudaram a dinâmica dos pátios de algumas escolas. Novas modalidades, como o vôlei, foram incluídas, mas o difícil rompimento com o esporte dominante resultou em interações mais igualitárias. As meninas aumentaram a atividade física, o jogo ficou mais compartilhado, e o recreio foi ocupado de forma mais equilibrada pelos alunos, que mudaram a percepção equivocada que tinham do futebol e de outros esportes serem apenas masculinos.
Nas avaliações, os alunos também afirmam sentir maior conforto e redução de conflitos após a reformulação dos pátios. Portanto, o modelo tradicional de quadra de futebol transmite uma imagem “cinzenta”, de muito cimento e “pesada” para quem a utiliza e quer um equipamento esportivo mais tranquilo e com mais vegetação, por exemplo.
No Brasil, no entanto, o desafio não é só pensar em uma adaptação, mas também construir do zero. Levantamento feito pelo Ministério da Cidadania, em 2021, aponta que quase metade das escolas de educação básica do país não tem nenhum espaço para os alunos praticarem esporte [4].
Embora devido à força popular o futebol tenha adquirido um caráter sagrado, especialmente no Brasil onde não faltam trabalhos acadêmicos que ressaltem o locus futebolístico como um espaço fértil para se pensar articulações do esporte inclusive com a religião, pode-se dizer, também, até pela própria natureza dialógica do discurso (BAKHTIN, 2002), que o sagrado por si só pressupõe o profano. Transportando essa reflexão para o contexto atual, em especial para a discussão a que se propõe este artigo, que tem por objetivo pensar nas implicações dos usos das ferramentas tecnológicas e das regras para tornar o futebol ainda mais atrativo para o consumidor, pergunta-se: o “sagrado” ou sobrenatural sobreviverá ao secular? Se ao invés da goleada do título, no domingo passado, o Fluminense tivesse sido derrotado pelo Flamengo como na final do Campeonato Carioca de 1991, quem seria o vilão? O árbitro ou o Sobrenatural de Almeida, personagem de Nelson Rodrigues que era responsabilizado por tudo de ruim que acontecia ao tricolor das Laranjeiras?
Essa discussão vem ao encontro das últimas decisões tomadas em Londres durante a reunião da IFAB (International Football Association Board), órgão da Fifa que regula o futebol mundial. [1] Ideias ventiladas antes do encontro apostavam para mudanças significativas nas regras do esporte mais popular do mundo que, segundo dados divulgados no ano passado pela Fifa [2], movimenta cerca de US$ 286 bilhões por ano. Com as cifras girando em torno do valor do PIB da Finlândia ainda existe espaço para pensar no esporte apenas como paixão ou, como diria Rita Lee, como poesia?
Há quem acredite que esse romantismo tenha diminuído bastante e seja quase uma coisa do passado, como o ex-árbitro FIFA Claudio Vinícius Cerdeira, que fazia parte da comissão de arbitragem da CBF até abril do ano passado.
“Hoje em dia você vê muito jogador que ama o clube até o momento que não aparece uma proposta um pouquinho melhor de outro clube. Aí ele passa a amar o outro. E se aparecer no ano seguinte uma proposta melhor de um terceiro clube, ele beija o escudo e a nova paixão dele passa a ser o novo clube. Então, realmente o romantismo hoje não tem mais espaço no futebol porque as cifras envolvidas são muito grandes. Os salários dos jogadores hoje são uma coisa fora do normal. O romantismo ficou em quinto plano. Nós tivemos aí craques de futebol no passado, até num passado recente, que não ganhavam a décima parte que um menino vindo das categorias de base e subindo para equipe dos profissionais ganha hoje em dia. Hoje se fala num salário de R$ 800 mil, R$ 1,5 milhão. É uma coisa de louco. Não tem mais romantismo. Tem é dinheiro no bolso. Tem o clube que paga mais e o jogador passa a amar, passa a beijar o escudo. Fora isso, o romantismo é perto de zero”, constata (CERDEIRA, 2023).
Mas para o torcedor, a paixão pelo time de coração continua em alta. Haja vista as costumeiras reações às derrotas, que vão do choro à revolta. No meio desse misto de sentimentos, muitas vezes está o árbitro, frequentemente vítima de agressões e ofensas morais dentro e fora de campo. E, num país em que a impunidade ainda impera, frequentemente os jogadores se livram de uma punição mais rigorosa. Tudo em prol do espetáculo. E é justamente para manter a espetacularização do esporte e minimizar os erros dos árbitros que foi implantado na Copa da Rússia o sistema eletrônico de apoio à arbitragem, conhecido como VAR (Video Assistant Referee). A tecnologia, usada em situações que envolvam lances duvidosos ou possíveis cartões vermelhos, hoje, até pelos vultosos investimentos dos clubes, é considerada imprescindível em jogos importantes de qualquer campeonato de futebol. Ainda mais porque competições importantes como a Copa do Brasil, a Libertadores, a Sul-Americana têm premiação por fases, o que torna cada jogo decisivo na medida em que quantias importantes para os clubes estão em jogo e, justamente por isso, erros são inadmissíveis. Daí a importância do VAR, como explica Cerdeira.
Fonte: acervo pessoal Cláudio Cerdeira
O VAR chegou para corrigir erros grosseiros que a gente via na televisão. O árbitro só tinha um ângulo de visão e muitas vezes era humanamente impossível observar todos os detalhes de um determinado lance. O VAR tem no mínimo oito câmeras para o árbitro consultar. Tem a câmera um, a câmera que aproxima, a câmera lenta, a câmera invertida. Então, você disseca o lance e a decisão é muito mais correta. Os erros grosseiros não acontecem mais. Pode acontecer um ou outro erro porque na verdade o VAR é um outro árbitro. Então, ele pode interpretar de uma forma e, o árbitro de campo, de outra. E, mesmo com todas as câmeras, algumas situações ainda provocam dúvidas e decisões controversas. Uns acham que sim, outros que não. Isso faz parte do futebol (CERDEIRA, 2023).
Cerdeira sabe bem o peso que é apitar uma partida decisiva como a que aconteceu no último dia 9 de abril. No Campeonato Carioca de 91, sofreu com as reclamações do Fluminense após ter expulsado dois jogadores. Independentemente de as expulsões terem sido justas e as regras cumpridas, ou não, as polêmicas foram inevitáveis.
Fonte: Lance!
O ex-jogador Junior, que disputou aquela final vestindo a camisa do Flamengo, não lembra de nenhum erro de atuação de Cerdeira.
Fonte: GloboEsporte.com
Cerdeira sempre foi um árbitro muito correto. Quando era escalado dava muita tranquilidade pra gente pela qualidade dele. Mas erros sempre existiram e sempre vão existir por parte da arbitragem porque eles são humanos, né? Ainda mais quando você tem regras de interpretação. No entanto, na minha opinião, agressões a árbitros deveriam receber penas bem severas. Não tem nem o que discutir (JÚNIOR, 2023).
Essas agressões voltaram a se repetir no estadual deste ano. No primeiro FlaxFlu da decisão, o árbitro Wagner Nascimento Magalhães depois de dar o cartão vermelho para o jogador Samuel Xavier acabou tendo que expulsar também o técnico do Fluminense, Fernando Diniz, por causa de um xingamento. Embora nas duas situações o árbitro estivesse respaldado pelo regulamento, as revoltas só foram amenizadas após a goleada do segundo jogo, que contou com uma arbitragem ainda mais cuidadosa.
Portanto, se as polêmicas e o nervosismo fazem parte das decisões, tudo indica que a comunicação do VAR com público não vá resolver de todo o problema. No entanto, a oportunidade de os árbitros poderem apresentar explicações para os espectadores presentes ou não no estádio, o que já acontece no futebol americano, promete dar mais transparência às decisões tomadas após o auxílio do VAR. A primeira experiência aconteceu no Mundial de Clubes, no Marrocos, quando as imagens do VAR foram transmitidas no telão no estádio, e serão novamente testadas no mês que vem, na Indonésia, no Mundial Sub-20 e, também, no Campeonato Brasileiro. A ideia da IFAB é fazer uma avaliação durante 12 meses para poder optar com segurança pela implantação definitiva do sistema.
O comentarista Junior acha a iniciativa de mostrar nos telões o que está sendo checado pelo VAR bem interessante.
Você tem a participação do próprio público que no momento também vai ver e decidir o que está sendo analisado pelo árbitro. Essa tecnologia veio para contribuir, sim, apesar de ainda termos muitos problemas com quem opera o mecanismo do VAR. Mas eu acho que é justo usar o VAR porque é muito difícil você perder um jogo por uma jogada ilegal. Tudo que for trazido para tornar o futebol mais justo é importantíssimo (JÚNIOR, 2023).
Fonte: Divulgação/FIFA
Outrossim, algumas mudanças vistas com bons olhos por parte da torcida como a substituição do relógio corrido pelo relógio parado, como acontece nas partidas de basquete, não têm prazo definido nem para implantação nem para teste. Embora a questão do tempo perdido durante as partidas seja bastante sensível também para as associações britânicas, que detêm quatro dos seis votos necessários para mudança de regras no futebol, não foi dessa vez que a mudança passou. A tendência é que os árbitros sigam dando acréscimos longos como os verificados durante a Copa do Catar e apenas algumas restrições para poupar tempo sejam adotadas.
Junior acha muito difícil que essa possibilidade do cronômetro parado venha um dia a ser adotada no futebol.
Eu acho que os acréscimos que fizeram durante a Copa do Mundo em alguns pontos foram até exagerados. Hoje como você tem cinco substituições de cada lado, perde no mínimo três minutos. Aí fica por conta do árbitro os acréscimos. Mas no futebol de campo fica mais complicado adotar o cronômetro parado, não vejo vantagem. A mudança aconteceu no futebol de salão pelas dimensões do campo. Além disso, as mudanças de regras no futebol ao longo da história foram poucas (JÚNIOR, 2023).
Os jogadores poderão continuar comemorando os gols de forma espontânea, claro que com o cuidado de não tirar a camisa ou subir em alambrados. No entanto, todo esse tempo de comemoração passará a ser devidamente medido e acrescido ao tempo de jogo.
Assim como para a filosofia a grande arte do homem seja roubar momentos do tempo para eternidade, o futebol reivindica a própria eternidade durante os 90 minutos. E, para isso, vai tentando diminuir as malandragens com novas regras, como a proibição dos goleiros atrasarem as cobranças de pênaltis, como fez o argentino Dibu Martínez na Copa do Mundo do Catar usando o jogo psicológico para desestabilizar os cobradores.
Mas outras mexidas nas regras ainda ficarão pendentes como a mudança da regra 15, que fala do arremesso lateral. Hoje a regra obriga que o lateral seja cobrado com as mãos embora a possibilidade da cobrança com os pés pudesse dar uma maior dinâmica ao jogo.
Independentemente da aparência de arbitrariedade que envolve essas definições de regras, o rito e a festa do futebol continuam vivos. Caberá aos jogadores, clubes, árbitros, torcidas e federações derrotarem o caos presente nas disputas pra dotarem de sentido as partidas e manterem, assim, a poesia e a sacralidade do esporte.
Referências
BAKHTIN,Mikhail. Marxismo e filosofia da linguagem. São Paulo: Hucitec Annablume, 2002.
CERDEIRA, Claudio Vinícius. Entrevista concedida à Andréa Bruxellas. Rio de Janeiro, 10 de abr. 2023.
ELIADE,Mircea. O sagrado e o profano: a essência das religiões. São Paulo: Martins Fontes, 2001.
JÚNIOR, Leovegildo L.G. Entrevista concedida à Andréa Bruxellas. Rio de Janeiro, 11 de abr. 2023.
O “FIFA+”[1], ou melhor, o FIFA Plus, é uma plataforma de streaming que oferece ao pesquisador uma variedade de fontes. Nela é possível assistir futebol ao vivo, ter acesso aos conteúdos originais da própria FIFA,[2] documentários de parceiros, podcasts, textos de diferentes naturezas e uma série de informações sobre o esporte mais popular do mundo. De fato, não é uma plataforma que tenha sido construída para a pesquisa histórica ou das ciências humanas. Ainda assim, dentro dela é possível investigar e realizar análise crítica de fontes, sobretudo aqueles que estão interessados na história do futebol e sua evolução ao longo do tempo.
O recém criado “FIFA+” é um prato cheio para os pesquisadores da área de esporte. Divulgação: FIFA.
Ao oferecer acesso aos ‘filmes oficiais’, podemos não apenas ver jogos e agentes históricos, mas também analisar este conteúdo com o objetivo de apreender melhor o contexto histórico em que o jogo estava inserido. Logo, é atentar à imersão subjetiva da vida em sociedade, do futebol como produto cultural e social pertencente a determinada época e, mais do que isso, como produção de significado e expressão de determinada cultura em determinado tempo histórico. Confesso que ao assistir aos filmes oficiais de 1930 até 2018, no futebol masculino, notei o quanto as vestimentas, os cabelos, as barbas, os objetos transportados pelos jogadores e até o material esportivo foram sendo modificados ao longo do tempo. O mesmo pode ser dito para além das quatro linhas.
Outro exemplo significativo foi o ‘filme oficial de 1930’,[3] a primeira Copa do Mundo que, na época, se chamava Taça Jules Rimet, brinda o espectador com imagens aéreas belíssimas de Montevidéu. Conta também com a presença, o relevo e o rosto de trabalhadores da região da Prata que levantaram o icônico estádio Centenário.
Por vezes, quando estudamos o fenômeno cultural, que é o futebol, colocamos à margem, em certa medida, aqueles que produziram os monumentos, os quais os homens – e cada vez mais as mulheres – se tornam gênios/as do ludopédio. Com isso, ao assistir o curto documentário sobre a Copa de 1930, vemos a reflexão basilar no campo da História Social que é pensar o peso ignorado, negligenciado e invisibilizado do registro da classe trabalhadora em contextos, sobretudo nessa indústria que hoje, movimenta enormes cifras apenas na FIFA-IB.
Ainda sobre os ‘filmes oficiais’ da FIFA, notamos uma pretensão da Instituição de construir uma história linear da própria Instituição se confundindo com a do futebol mundial, cruzando o futebol praticado por homens e aqueles praticados por mulheres. Embora Joseph Blatter tenha dito no final da década de 90 que “o futuro do futebol é feminino”,[4] com a primeira Copa do Mundo ocorrida em 1991,[5] na China, o primeiro ‘filme oficial’ da FIFA consta de 2011. Sendo assim, dentro do próprio canal oficial ainda consta um hiato de duas décadas de silenciamento e invisibilidade de corpos femininos praticantes do futebol.
Acredito que a própria ‘FIFA +’ mereceria um estudo de caso próprio. Salta aos olhos o quanto o futebol se tornou capaz, ele mesmo, de se tornar um produto de expressão cultural que nos une e, ao mesmo tempo, nos distingue. Na medida em que se apresenta como ‘universalizante’, foi possível notar processos particulares na relação do fenômeno – jogo de bola – com determinadas sociedades. Talvez, identificar mais do que a importância da Copa do Mundo para as sociedades contemporâneas, seja interrogar os processos de como este fenômeno se relaciona com essas sociedades e questionar como estas são socialmente construídas. Não sabe o que fazer após terminar essa leitura? Que tal navegar um pouco no ‘FIFA +’.
[4] TIESLER, Nina Clara, et al. Introdução: O Futebol Globalizado: Uma Perspectiva Lusocêntrica. Análise Social, vol. 41, no. 179, 2006, pp. 313–43. JSTOR, Disponível em http://www.jstor.org/stable/41012272. Acesso em 6 abr. 2023.
Em 2017, a ODEPA[1] elegeu Santiago como sede dos XIX Jogos Pan-Americanos. Espera-se que a abertura dos jogos seja feita por Gabriel Boric, o atual Presidente socialista chileno, no dia 20 de outubro, 50 anos após o golpe de Estado e do cancelamento dos Jogos que iriam ser realizados no Chile em 1975 e que deveriam ter sido abertos pelo então presidente Salvador Allende, também socialista.
“Sóbrio, imponente, no nível dos congressos olímpicos”. Assim qualificou Carlos Guerrero, um experiente jornalista que trabalhou na revista chilena Estadio desde 1941 até 1981, no décimo segundo congresso da Organização Esportiva Pan-Americana (ODEPA), realizado de 29 a 31 de maio de 1973, em Santiago do Chile.
Presidente Salvador Allende e Sabino Aguad, em 1973.
A ocasião era importante para as lideranças esportivas e políticas do Chile, entre outros motivos, porque uma comissão avaliadora da ODEPA examinaria os preparativos dos VII Jogos Pan-Americanos de 1975 que seriam realizados na capital chilena. A presença do irlandês Michael Morris, conhecido como Lorde Killanin pelo seu título de nobreza, realçou o congresso, mas aumentou a exigência sobre os seus responsáveis. Para além do seu desenvolvimento bem-sucedido, Killanin, que havia sido eleito presidente do Comitê Olímpico Internacional (COI) no ano anterior, percebeu em sua passagem pelo Chile a dificuldade mais urgente que enfrentavam os organizadores destes Jogos. Sua previsão sobre o evento, ligado ao futuro do governo do socialista Salvador Allende, seria bem-sucedida.
A ODEPA havia escolhido Santiago como sede dos Jogos em agosto de 1969, mais de um ano antes de Allende assumir a presidência. O democrata-cristão Eduardo Frei, seu antecessor, apoiou a candidatura santiaguina e ratificou seu apoio uma vez que Santiago foi escolhida. No entanto, os preparativos foram parcimoniosos. Por exemplo, somente em novembro de 1970, no mês da assunção de Allende, que o poder legislativo aprovou uma lei que destinava dinheiro “para cumprir os fins dos Jogos Pan-Americanos de 1975”.
No entanto, o trabalho também não foi consideravelmente acelerado no início da sua Presidência. Em abril de 1972, Allende “clamou para que sacudíssemos a inércia […] não só para cumprir o compromisso que devemos cumprir em relação aos Jogos Pan-Americanos de 1975, mas também pelo desenvolvimento das atividades esportivas nacionais”. Neste sentido, o chefe de Estado propôs estimular uma “revolução esportiva nacional” para que o esporte fosse considerado “um direito social” e anunciou a ação coordenada do governo para construir as obras necessárias para os Jogos.
Ao que parece, a paralisia foi ligeiramente abalada durante 1972, já que em sua Mensagem ao Congresso em 21 de maio do ano seguinte, a poucos dias da reunião da ODEPA em Santiago, Allende informou sobre a “iniciação de estudos para um vasto programa de obras que tem relação com os Jogos Pan-Americanos”.
Nesse sentido, Estadio explicou que “existiam dúvidas devido ao atraso nas edificações, a busca pelo dinheiro, o alistamento das equipes de obras e outras necessidades”. Ao mesmo tempo, declarou que, durante o congresso da ODEPA, a Comissão Organizadora dos Jogos (COJ) teria a oportunidade de esclarecer “o que temos feito e explicar como faremos o que falta”. A revista classificou Killanin como espectador privilegiado do processo de avaliação.
O presidente do COI, que aproveitou o convite ao congresso da ODEPA para realizar uma extensa turnê pela América Latina, chegou a Santiago em 28 de maio, depois de visitar o Brasil, o Uruguai e a Argentina. No dia seguinte assistiu à abertura. Allende, impossibilitado de comparecer, lhe enviou uma placa comemorativa por meio de José Tohá, ministro da Defesa e presidente honorário da COJ, que representou o governo. Tohá garantiu aos membros da ODEPA: “O esporte é uma necessidade e um direito na comunidade”. Assegurou também que as obras estariam prontas, prometendo: “O Chile cumprirá em 1975”.
Por sua vez, Sabino Aguad, presidente tanto da COJ quanto do Comitê Olímpico Chileno (COCH), bem como diretor geral de Esportes e Lazer do governo, disse que uma das características que deveria distinguir os Jogos era a de “um esforço coletivo para promover no país um maior desenvolvimento da educação física e do desporto”.
Depois de visitar as instalações esportivas para os Jogos e de receber a relação de Pedro Ramírez Vázquez, presidente do Comitê Olímpico Mexicano e membro do COI, a cargo da comissão avaliadora, a ODEPA confirmou Santiago como sede dos Jogos. “Se teve fé – escreveu Guerrero – em que tudo estará pronto a tempo, mesmo com o atraso que é visível neste momento”.
Este otimismo era parcialmente compartilhado por Killanin. Em um informe de agosto, ele ressaltou a cooperação entre o governo e as instituições esportivas chilenas. Killanin exemplificou com o caso de Aguad. O relatório também ressaltava que havia dúvidas consideráveis sobre a capacidade de Santiago para organizar os Jogos devido à situação política chilena.
Killanin disse ter feito averiguações discretamente que o levaram a crer que não haveria problemas enquanto o governo de Allende “se mantenha unido e estes jogos unam o povo de Santiago”. No entanto, acrescentou: “Claro que existe o risco de um movimento contrário ao governo, caso em que a situação pode mudar”. A respeito disso, comentaram a Killanin um fato que achou digno de ser incluído no relatório: durante o segundo jogo da final da Copa Libertadores entre Colo-Colo e Independente da Argentina, jogado na noite do primeiro dia do congresso da ODEPA no Estádio Nacional de Santiago, Allende foi assobiado e vaiado quando apareceu na tribuna presidencial.
Ao concluir o congresso da ODEPA, Killanin continuou a turnê latino-americana visitando Panamá, Colômbia e México. Poucas semanas após o seu regresso ao Reino Unido, em 29 de junho, Allende sofreu uma tentativa sangrenta de golpe de Estado chamado Tancazo. Embora sufocado, o levante aprofundou um quadro complexo.
Ainda assim, a COJ continuou o seu trabalho e o governo promoveu um projeto de lei estabelecendo normas relativas aos Jogos. Menos de três meses depois, em 11 de setembro, Allende foi finalmente deposto por outro golpe sangrento de Estado que instalou uma junta militar de governo liderada por Augusto Pinochet, dando início a uma ditadura sangrenta que se prolongaria até 1990.
No dia 1º de outubro, menos de três semanas após a derrubada de Allende, os militares do governo receberam Aguad, que expôs os preparativos para os Jogos, e decidiram cancelá-los devido à “situação econômica crítica que o país vive”. Apesar disso, autorizou o “adiamento” para 1977. Ironicamente, a reunião teve lugar no mesmo edifício (UNCTAD III) no qual tinha sido inaugurado o congresso da ODEPA, que a partir do golpe de Estado passou a ser a sede da Junta de Governo.
No final de outubro, o venezuelano José Beracasa, presidente da ODEPA e membro do COI, visitou membros do poder ditatorial nesse edifício junto a diretores do COCH e da COJ. Ele apresentou a possibilidade de organizar os Jogos em Santiago ainda em 1975 e apontou soluções para reduzir seus custos. A Junta Militar se comprometeu a dar uma resposta definitiva em 48 horas. Beracasa declarou: “Serão jogos mais modestos, mas serão feitos no Chile se o Governo o autorizar”. A Junta não o fez, materializando o risco que tinha mencionado Killanin. Os Jogos foram transferidos para a Cidade do México.
Em 2017, a ODEPA escolheu Santiago como sede dos XIX Jogos Pan-Americanos. Espera-se que sejam abertos por Gabriel Boric, o atual Presidente socialista, em 20 de outubro deste ano, 50 anos após o golpe de Estado e daquele cancelamento.
Texto originalmente publicado em eldesconcierto.cl no dia 29 de março de 2023.
Imagine arrecadar R$150 mil por um único movimento: derrubar seu adversário dentro da área no primeiro tempo do jogo. Essa foi a promessa que apostadores fizeram a três jogadores de três clubes da Série B do Campeonato Brasileiro. A proposta era simples, os jogadores deveriam cometer um pênalti no primeiro tempo de seus respectivos jogos, todos válidos pela última rodada da Série B do Brasileirão 2022. Se os jogadores cumprissem o combinado, cada um levaria para casa R$150 mil – R$10 mil pagos como sinal antes dos jogos e R$140 mil depois que a aposta [de que aconteceriam três pênaltis nesses três jogos] fosse vencedora. Já os apostadores esperavam faturar aproximadamente R$2 milhões com o “palpite”.
Apesar de toda a trama, o esquema não foi bem-sucedido. Duas marcações de pênalti chegaram a ocorrer no dia 5 de novembro: no jogo entre Sampaio Corrêa e Londrina, o lateral-direito Mateusinho, do Sampaio, sacramentou sua parte do combinado e derrubou um jogador do Londrina dentro da área aos 19 minutos do primeiro tempo; enquanto Joseph, zagueiro do Tombense, demorou um pouco mais, foi apenas aos 30 do primeiro tempo que o jogador empurrou Lohan e garantiu um pênalti para o Criciúma. Foi a partida entre Vila Nova e Sport, no dia 6 de novembro, que estragou o plano dos apostadores. Romário, volante do Vila Nova envolvido no esquema, sequer foi relacionado para o jogo e não houve qualquer penalidade máxima na partida.
Toda a trama foi descoberta justamente por ter dado errado. A denúncia ao Ministério Público de Goiás foi feita pelo presidente do Vila Nova, Hugo Jorge Bravo, que foi avisado por pessoas de fora do clube sobre o envolvimento do volante Romário em apostas esportivas. O clube investigou o caso e conseguiu contato com um empresário de São Paulo, que seria o articulador de todo o esquema. O homem até mesmo pediu ao presidente para cobrar do jogador o sinal de R$10 mil dado antes da partida ocorrer. Os suspeitos podem ser enquadrados em três crimes diferentes: associação criminosa, lavagem de dinheiro e corrupção em âmbito esportivo. Até o momento apenas o empresário suspeito de entrar em contato com os jogadores e articular o esquema foi preso preventivamente, os clubes foram isentos de qualquer participação no esquema.
O objetivo deste texto não é falar especificamente sobre esse caso, mas sim propor uma reflexão a respeito de algo que poderia evitar esse tipo de crime: a regulamentação das apostas esportivas. Desde 2018, quando, o então presidente da República, Michel Temer, sancionou a lei 13.756/18, a indústria de apostas esportivas online passou a ser legalizada no Brasil. Além de legalizar a prática, a referida lei determinava uma série de medidas: as casas só poderiam operar online (sem pontos de venda fixo), os sites deveriam estar hospedados fora do Brasil e uma regulamentação do setor deveria ser feita em até quatro anos. O prazo final para essa regulamentação estava previsto para dezembro de 2022, entretanto, o ex-presidente Jair Bolsonaro, por influência de bancadas conservadoras da Câmara, não assinou o decreto de regulamentação elaborado pela Casa Civil e Ministério da Economia. Agora, o processo fica a cargo do governo recém-eleito, que analisa a questão de maneira positiva e, de acordo com declarações dadas ao UOL Entrevista pelo Ministro da Fazenda, Fernando Haddad, um projeto para o setor já está em andamento.
Fonte: Agência Brasil
Um dos maiores receios em relação às apostas esportivas online é a manipulação de resultados. Entretanto, esse tipo de esquema não é algo recente no futebol, vide um dos casos mais emblemáticos no Brasil, a Máfia do Apito[1], que ocorreu em 2005, quando os sites estavam longe de fazerem o sucesso de hoje – de acordo com o site Mktesportivo, o setor movimentou R$7 bilhões em 2020. Ao contrário do que muitos pensam, a regulamentação das atividades de casas de apostas pode oferecer meios para impedir fraudes esportivas. Isso porque, como afirma Andreas Bardun, CEO global do site de apostas KTO, as plataformas possuem uma extensa base de dados sobre seus clientes e seus hábitos de apostas. Sendo assim, o monitoramento de suas atividades financeiras por órgãos governamentais seria crucial para rastrear atividades suspeitas. As próprias casas trabalham com inteligência artificial para identificar possíveis fraudes, uma vez que elas são as maiores prejudicadas com manipulações, pois pagam altos valores em apostas com chances improváveis.
É claro que os problemas não irão se resolver automaticamente apenas com esse monitoramento e troca de informações, uma vez que há a possibilidade de apostadores usarem laranjas para despistar as autoridades. Nesse caso, a fiscalização fica obviamente mais difícil, mas algumas medidas podem ser impostas, como a obrigatoriedade de que qualquer movimentação relativa à aposta seja feita em conta bancária vinculada ao apostador cadastrado. De acordo com Rafael Marcondes, diretor da Associação Brasileira de Defesa da Integridade do Esporte, dessa forma, a Receita Federal conseguiria rastrear se essas movimentações são compatíveis ou não com a renda do apostador.
Outro ponto positivo é a alta arrecadação de impostos que essa indústria permite, o que vem sendo a principal motivação para o atual governo regulamentar as apostas esportivas. Hoje, as mais de 500 casas de apostas ativas no país operam com seus sites hospedados no exterior, o que dificulta até mesmo a estimativa de quanto dinheiro está envolvido nesse setor, os números podem estar entre R$8 bilhões e R$12 bilhões, quem sabe mais. Com a regulamentação, esses sites deverão operar 100% no Brasil, mantendo o dinheiro aqui, o que também deve gerar mais empregos. Empresas como a Esporte da Sorte acreditam que uma vez sediadas no país, as movimentações financeiras serão menos custosas e mais práticas, pois, mesmo operando em paraísos fiscais – países com baixa ou nenhuma taxação de imposto – a repatriação do lucro líquido fica cara.
Fonte: Vitor Silva/Botafogo / Em 2022, os patrocinadores master dos dois clubes eram as casas de apostas Blaze e Betano
O governo prevê uma arrecadação anual que beira a casa dos R$6 milhões oriunda da tributação dessas empresas. Nesse sentido, há uma preocupação com a incidência das cobranças. O modelo considerado ideal vem do Reino Unido, onde a taxação é feita em cima dos lucros dos operadores (as casas de apostas). Há a possibilidade de a taxação brasileira seguir o mesmo padrão da Loteria Federal, uma cobrança de 30% do valor do prêmio, nesse caso, a cobrança sairia do lucro do apostador. Para Andreas Bardun, da KTO, essa não é uma boa opção, uma vez que os apostadores poderiam recorrer ao mercado clandestino para conseguirem um ganho maior com seus palpites.
O marketing é um dos grandes trunfos dos sites de apostas esportivas. Atualmente, 11 marcas estampam as camisas de 19 dos 20 clubes da Séria A do Brasileirão 2023. Além disso, alguns sites chegam a patrocinar os campeonatos em si, como é o caso da Betnacional com o Campeonato Carioca, da Galera.bet com o Brasileirão e de outras quatro casas que patrocinam o Campeonato Paulista. Publicidades dessas casas estão presentes em todos os meios possíveis, desde outdoors nas ruas, passando por anúncios nas redes sociais e chegando aos comerciais de TV. Seus embaixadores são grandes estrelas do esporte mundial: Vinícius Júnior (Betnacional), Marcelo (Sportingbet), Denilson (Sportsbet.io), Zico (Pixbet), Edmundo (Pixbet), entre muitos outros; Aliás, essa questão é algo que gera muito debate, pois, de acordo com o regulamento da Fifa, atletas são proibidos de participarem de apostas, demonstrarem interesse em ações de casas de apostas esportivas ou se tornarem sócios de alguma plataforma. Em teoria, a legislação esportiva brasileira está sujeita às determinações da Fifa, mas sem a regulamentação algumas barreiras não são delimitadas.
Fonte: Gráfico produzido pela autora, tendo como base a matéria “Dos 20 times da Série A, 19 são patrocinados por casas de apostas”[2]. A Pixbet patrocina a maior quantidade de clubes: Flamengo, Vasco, Corinthians e Santos.
Apesar de ter um mercado gigantesco no Brasil, as empresas ainda precisam lidar com a insegurança que a falta de diretrizes legais traz. Sem a devida regulamentação, as operações em território nacional se tornam um tanto quanto perigosas, pois não é possível saber onde está a linha entre o lícito e o ilícito, nem há qualquer garantia para os investimentos tanto das empresas quanto dos próprios apostadores. A falta de legislação impede o crescimento do setor, uma vez que empresas ficam receosas de atuar no Brasil “às cegas”. A regulamentação, então, permitiria o fortalecimento das marcas e abriria caminho para uma relação mais transparente entre as casas e seus clientes, que teriam a quem recorrer quando um dos lados agir de má fé.
De todos os benefícios, talvez o combate à ludopatia (vício em apostas) seja o maior deles. Hoje é impossível que as entidades de saúde tenham acesso aos hábitos de apostas das pessoas cadastradas nos diversos sites atuantes no Brasil. Com a regulamentação, esses dados estariam à disposição das organizações governamentais e seria possível criar não apenas mecanismos de limite dessas apostas, como também políticas públicas eficazes para o controle da condição. A regulamentação, obviamente, não fará milagres nesse ou em qualquer outro sentido, mas é uma possibilidade a ser considerada como uma aliada para combater os vícios oriundos das apostas.
Por maiores que sejam as desconfianças com esse “novo” mercado e exista, com certeza, o medo de que as fraudes destruam o futebol, é preciso compreender que esses sites continuarão em expansão, pois, no Brasil especialmente, as apostas são tão antigas quanto o próprio esporte. Agora, para resguardar essa grande paixão do brasileiro, diretrizes rígidas e fiscalização constante se fazem necessárias. Tanto empresas quanto apostadores precisam estar dentro das quatros linhas da lei, só assim, o futebol continuará seguindo seu curso natural e encantando seus aficionados com suas loucuras e imprevisibilidades.
[1] A Máfia do Apito foi um esquema de manipulação de resultados do Campeonato Brasileiro de 2005 que beneficiava apostadores. No centro do caso estavam os árbitros Paulo José Danelon e Edilson Pereira de Carvalho, que chegaram a faturar R$10 mil por partidas fraudadas. 11 jogos apitados por Edilson foram anulados e disputados novamente, o que alterou a classificação e sagrou o Corinthians campeão.
“Sensação do Campeonato Paulista, o Água Santa está garantido na Série D do Brasileirão e na Copa do Brasil de 2024. Com as vagas em mãos, o clube de Diadema optou por interromper as atividades do elenco profissional no segundo semestre desta temporada. Assim, serão no mínimo oito meses sem jogar entre abril, numa possível final do Paulistão, e janeiro do ano que vem”.[1]
O ano de 2023 começou para o futebol brasileiro masculino de alto rendimento com as equipes profissionais disputando seus campeonatos estaduais. No Rio de Janeiro e em São Paulo, a fase final das competições contou com a presença de alguns clubes considerados “zebras” e, no presente texto, damos um enfoque maior ao Água Santa e ao Volta Redonda, semifinalistas nos Campeonato Carioca e Campeonato Paulista.
O Esporte Clube Água Santa é uma equipe da cidade de Diadema, mesorregião metropolitana do estado de São Paulo, e foi fundado em 27 de outubro de 1981 “por imigrantes nortistas, nordestinos e mineiros, que viam no clube a única possibilidade de lazer”.[2] A versão histórica de criação da instituição presente em seu site oficial já mostra, por si só, relação com o surto migratório Nordeste-Sudeste fruto da rápida industrialização paulista a partir dos anos 1930,[3] bem como associa o nascimento da entidade a grupos de menor poder aquisitivo.
Fonte: Agência Brasil
O Volta Redonda Futebol Clube surgiu nos anos 1970 como parte do processo de reforço identitário da cidade homônima do Rio de Janeiro, famosa por ser o local de instalação da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) durante a Era Vargas (1930 – 1945). Desde seu princípio, a agremiação contou com o apoio institucional de outras entidades do gênero, pois o “então presidente da Liga de Desportos de Volta Redonda, Getúlio Albuquerque Guimarães, iniciou então o projeto, juntamente com o presidente do Flamenguinho de Volta Redonda, Guanayr de Souza Horst, para criar um clube de futebol para representar a cidade no novo Campeonato Estadual do Rio de Janeiro”.[4] Ademais, o próprio poder público se envolveu para ajudar no desenvolvimento do projeto que necessitava de um campo de jogo adequado e, por isso, “Nessa época, o Estádio Raulino de Oliveira pertencia à Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) e era administrado, em regime de comodato, pelo Guarani Futebol Clube, tradicional time amador da cidade. A prefeitura, a CSN e a Confederação Brasileira de Desportos (atual CBF), fizeram um acordo para a reforma do estádio, a fim de que abrigasse o novo time”.[5]
Fonte: Torcedores
Ambas as equipes possuem histórias ligadas ao desenvolvimento industrial no Brasil, o qual pode ser visto como parte do processo de urbanização de partes do país, algo essencial para a difusão do futebol. Todavia, estas equipes ficaram condicionadas dentro da lógica do futebol masculino de alto rendimento como clubes pequenos, cuja existência, na maior parte das vezes, é ignorada e, portanto, sem utilidade. Dessa forma, cabe-nos perguntar: para que servem os clubes “pequenos”?
Se partíssemos da perspectiva de que o futebol só tem a relevância atual por causa dos grandes times, dos super astros e dos jogos marcantes em estádios lotados, certamente nossa resposta à pergunta “para que servem os clubes ‘pequenos’?”, seria “para fornecer jogadores aos clubes maiores”. A perspectiva de que em torno de um centro futebolístico orbitam aspectos para engrandecê-lo é antiga e existente no Brasil desde os primeiros chutes,[6] não podendo, aliás, ser vista como algo natural, mas fruto dos processos de construção excludentes que caracterizaram a Primeira República (1889 – 1930).[7] Esta perspectiva está tão enraizada na sociedade brasileira que ainda se faz presente na atualidade pela pouca relevância atribuída aos clubes “pequenos” ou mesmo em vinculando-os como sujeitos ativos apenas quando podem ser associados às equipes consideradas “maiores”.
A visão hierarquizada dos times futebolísticos traz consigo o caráter excludente por meio do qual clubes com menos títulos “de expressão” acabam sendo esquecidos, ignorados e/ou apenas são lembrados somente quando conseguem obter sucessos dentro de campo semelhantes às das grandes equipes. Contudo, a realidade é bem mais complexa do que isso e, principalmente, é preciso considerar estas equipes dentro das suas possibilidades e percebê-las enquanto agremiações ativas e independentes dos chamados times grandes.
+ Historicamente, muitos dos times ditos pequenos foram responsáveis pelo desenvolvimento cotidiano do futebol em bairros que os clubes grandes não se faziam presentes com frequência. Foi por meio deles, aliás, que as relações de identidade futebolísticas foram construídas e consolidadas, motivo forte o bastante para não associarmos os times pequenos como hierarquicamente inferiores àqueles chamados grandes, mas igualmente importantes para a história do esporte bretão no Brasil.
[7] FERREIRA, Jorge; DELGADO, Lucilia de Almeida Neves (orgs.). O Brasil Republicano: O tempo do liberalismo excludente. Da Proclamação da República à Revolução de 1930. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003.
Em entrevista concedida ao professor assistente no Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Linguagens na Universidade Tuiuti do Paraná (UTP) Marcio Telles, Gumbrecht falou sobre sua paixão pelos esportes, o papel da presença na experiência do torcedor, as diferenças entre assistir ao esporte fisicamente no estádio e de maneira mediada, dentre outros temas. A entrevista completa foi publicada na revista Interin e foi gentilmente autorizada a publicação no blog no LEME.
O fenômeno dos haters nas redes sociais me fazem lembrar do futebol, afinal desde muito as arquibancadas e, até mesmo, as narrativas da imprensa são uma espécie de escola de formação de gente que destila opiniões raivosas, sem o mínimo pudor. É certo que esse sentimento é parte das nossas vidas e, também, é parte do futebol, afinal, em um espetáculo no qual as afetividades são constantemente acionadas, não podíamos imaginar que apenas o discurso do amor pudesse servir de alimento para o universo futebolístico. Há muito espaço para o seu reverso. A socióloga Janet Lever não deixou de reconhecer que o futebol é um poderoso produtor de símbolos compartilhados e, por isso, os “pontos focais de hostilidade também unem as pessoas” (1983, p. 157).
Olhando à primeira vista, o futebol poderia corroborar as constantes visões negativas acerca da humanidade sendo referencial as ideias que o filósofo Thomas Hobbes defendeu em seu Leviatã, e que partiam da hipótese de que o ser humano é naturalmente inclinado para o mal. Devido a essa característica, para Hobbes faz-se necessária a intervenção de leis rígidas para que o ser humano consiga sair de seu estado natural e adentre no estado civil.
De acordo com Rutger Bregman (2021), essa hipótese poderia ser denominada de “teoria do verniz”[1] o que implica dizer que as leis socialmente compartilhadas e estipuladas por alguma instância de poder – como por exemplo o Estado – serviriam como um mecanismo de controle da nossa tendência à maldade, à traição e diversas atitudes condenáveis. Mas esses mecanismos de contenção formariam uma camada de verniz fina que com certa facilidade pode ser descascada, trazendo à cena nossa “verdadeira natureza”.
O ambiente futebolístico é um daqueles em que essa camada de verniz se mostra por vezes frágil. Assim, como outros ambientes de trabalho, o mundo do futebol espetáculo está longe de ser um lugar acolhedor. A competitividade é grande e os interesses financeiros pautam grande parte das ações. A vaidade é imensa e as emoções são exaltadas, o que, frequentemente, deriva em variadas manifestações de violência. Em quais outros ambientes de trabalho, os profissionais são alvo de agressões verbais constantes no momento mesmo em que desempenham suas funções? E tudo isso ocorre de modo explícito e, muitas vezes, legitimado, por seus próprios colegas. E legitimado por nós torcedores.
No futebol, podemos ouvir afirmativas do tipo “a arbitragem roubou o jogo”, “tal jogador é limitado e não tem condições de vestir tal camisa”, “esse técnico é um burro” ou “esse técnico precisa ser demitido”. Frases desse tipo são ditas pela torcida, mas também por jornalistas que expressam sua opinião em veículos de comunicação massivos. E isso tudo é feito tendo como motivação, muitas vezes, emoções de momento que perdem a força com o tempo, mas podem deixar de herança estragos em carreiras ou mesmo na vida psíquica de alguém.
Esse ambiente hostil poderia ser diferente?
A série Ted Lasso[2] nos faz refletir sobre essa possibilidade.
Fonte: Beyond Games. biz
Nos últimos cinco anos, são diversas as produções seriadas – documentais ou ficcionais – que têm o esporte como tema. Nessa listagem grande e variada, Ted Lasso se destaca pelo humor simples e porque de modo despretensioso nos mostra que a convivência humana pode ser boa, mesmo em meio a um mundo tão competitivo no qual somos estimulados a desconfiar do outro, a menosprezá-lo e, frequentemente, tratá-lo como potencial inimigo.
Ted Lasso nos faz pensar sobre a possibilidade de um “novo realismo”, proposta trazida por Rutger Bregman em seu instigante livro Humanidade. Uma história otimista do homem.
Quem já não foi taxado de romântico ou mesmo iludido pelo simples fato de ter demonstrado algum tipo de fé na humanidade? Quantas vezes já não ouvimos – ou mesmo falamos – que na vida é preciso ter sempre cuidado, afinal somos cercados por pessoas que estão prontas para nos apunhalarem pelas costas. Geralmente essas afirmações são proferidas com profundo orgulho de quem se considera não uma pessoa pessimista, mas sim realista.
É absolutamente interessante o sentido que a palavra realismo adquiriu em nosso cotidiano. Ser realista significa basicamente compreender a natureza humana como essencialmente ruim. Bregman se pergunta: Por que não pensar o contrário? Por que ser realista implica olhar o mundo e as pessoas a partir de um viés negativo? O que chamamos de realismo, portanto, é uma interpretação possível, enviesada, e que está longe de corresponder a alguma verdade a respeito da nossa existência.
É verdade que não faltam exemplos do poder destrutivo que carregamos em nós mesmos. Guerras, violências cotidianas, a fome, a escravidão enfim, o “o horror, o horror” como gritou o personagem Kurts de Coração das trevas de Conrad, é uma das marca a breve história da espécie humana na terra.
Mas poderíamos listar evidências da nossa capacidade de ajudar quem precisa, de promovermos lutas pelo bem-estar coletivo, na possibilidade de sentirmos alegria no simples ato de olhar o dia nascendo e na nossa capacidade de inventarmos modos de estamos juntos.
O futebol, aliás, é uma dessas invenções
Rutger Bregman propõe que deveríamos construir um “novo realismo”, a partir de uma visão mais otimista sobre a humanidade. Exemplos não faltariam – e o autor elenca alguns – bastaria uma mudança de perspectiva em relação a narrativa construída acerca da nossa história.
O seriado Ted Lasso nos faz imaginar a viabilidade desse novo realismo.
Ted Lasso: um olhar otimista, mas não ingênuo
O personagem que dá nome a série nasceu, em 2013, de um comercial feito para promover a transmissão do campeonato inglês pela emissora americana NBC. Na campanha, o ator Jason Sudeikis interpreta um técnico de futebol americano que vai treinar o Richmond FC., um time da Premier League. O objetivo era brincar com características do futebol que provocam estranhamento no público americano como, por exemplo, o fato de o jogo terminar sem necessariamente ter um vencedor.
Em 2020, Ted Lasso – também interpretado por Jason Sudeikis – se transformou em protagonista de seriado homônimo. O mote da história é o mesmo da propaganda, o que representa um desafio e tanto, afinal não é nada fácil justificar a contratação de um técnico de futebol americano por um clube que disputa a Premier League, uma das mais importantes competições daquele futebol inventado pelos ingleses.
A solução narrativa encontrada soa como um tanto exagerada e um tanto melodramática ao recorrer a um tópos muito comum da ficção: a vingança. Mas nada é tão simples assim quando se trata da série Ted Lasso
Ted Lasso chega a Premiere League para treinar o modesto Richmond. Sua contratação foi parte dos planos da personagem Rebecca Welton que se tornou proprietária do clube como resultado da divisão de bens após um processo de divórcio. Por ter sido abandonada pelo marido que a troca por uma mulher mais jovem e publicamente sentir-se humilhada, Rebecca resolve vingar-se do ex-marido – e ex-dono do Richmond -, destruindo aquilo que ele mais amava. Para isso chama Ted Lasso, um treinador de futebol americano que havia ficado famoso após protagonizar a comemoração de uma vitória de seu time, com uma engraçada dança que viralizou na internet.
Você poderia pensar que dificilmente esse tipo de contratação seria possível, afinal de contas o futebol é um negócio e tratá-lo a partir de motivações pessoais, somente traria prejuízos financeiros. Mas prejuízo para quem? Rebecca Welton é milionária e sua fortuna não seria comprometida caso o Richmond, por exemplo, deixasse de existir. O mesmo poderíamos pensar em relação aos irmãos Avram e Joel Glazer que se tornaram proprietários do Manchester United ao herdarem o clube do pai, Malcom Glazer, falecido em 2014. A família Glazer deixaria de ser bilionária caso o Manchester United fechasse as portas?
O enredo de Ted Lasso, portanto, está longe de parecer impossível e até mesmo soa como uma provocação ao contexto esportivo contemporâneo. Afinal, a partir do momento em que um clube de futebol se torna propriedade de uma pessoa, são grandes os riscos dele ficar à mercê dos mandos e desmandos de seu dono ou sua dona. Os movimentos de resistência torcedora ao redor do mundo dão mostras do quanto torcedores sabem desse risco.
Sendo assim, com plenos poderes, Rebecca poderia fazer o que bem entendesse do Richmond, o que inclui insistir em seu plano de vingança. Mas Ted Lasso não um é seriado que reitera lugares comuns e nem os estereótipos da mulher abandonada e ressentida. Rebeca com o tempo se revela uma personagem complexa que vai ocupando seu espaço de protagonismo na série e no clube Richmond.
As mulheres mandam, mas quem joga são os homens e alguns chamam mais atenção fora do que dentro de campo como é o caso de Jamie Tartt. Habilidoso, vaidoso, arrogante, mulherengo e indisciplinado, o personagem é uma alusão – pouco disfarçada – a Cristiano Ronaldo e tantos outros jogadores-celebridade, figuras tão comuns no cenário atual do futebol. Como contraponto a Jamie, há o capitão Roy Kent. Dedicado aos treinamentos e aos jogos, Roy carrega um semblante austero e um temperamento forte, sendo temido e ao mesmo tempo respeitado pelos colegas. Mas esse protótipo de macheza frequenta um fã clube de novelas às escondidas, o que o ajuda a lidar com a necessidade de dar fim à carreira de jogador devido a problemas físicos.
E Ted Lasso?
Dono de uma simpatia que às vezes o torna inconveniente, o técnico é um homem atrapalhado, que não entende absolutamente nada de futebol inglês e que, antes de tudo, opta por tentar viver em harmonia com as pessoas, mesmo tendo motivos para agir de modo oposto. Quando Ted chega à Inglaterra é recebido com severas críticas da imprensa e xingamentos da torcida. Os jogadores o tratam com desprezo ou deboche, fazendo dele um motivo constante de piada. Mas para espanto de todos, mesmo sendo maltratado Ted Lasso não revida com a mesma moeda. E tão pouco oferece a outra face. O treinador tem plena consciência do tipo de tratamento que recebe, mas com o tempo sua relação com os profissionais do clube, com os atletas vai se modificando e transformando-se em amizade, como é o caso de Rebeca.
Pode parecer que estamos caminhando para mais uma história melodramática de redenção em que a mensagem principal a ser passada aos espectadores é a de que a vida é bela e que os conflitos, preconceitos e várias mazelas da vida são vencidos em prol do amor e da amizade. Mas não é bem assim que a série conduz sua narrativa. Embora o clube torne seu ambiente menos hostil, em grande medida, por causa da interferência da figura de Ted Lasso, o Richmond luta a duras penas para se manter na primeira divisão inglesa. As derrotas continuam a gerar preocupação e irritação na torcida, assim como continuam constantes os desafios de integrar, em um mesmo grupo, jogadores com histórias de vida e interesses tão díspares. Jogadores muitos dos quais vindos de fora da Inglaterra e alvos constantes de preconceito.
A série não oferece uma varinha de condão mágica capaz de mudar a realidade e nos fazer sentir algum tipo de catarse redentora ao final de cada episódio. Camaradagem não é um atributo que possamos entender como algo que seja natural ao personagem Ted Lasso. O comportamento de Ted é derivado de uma luta constante consigo mesmo, uma luta metaforizada no trabalho de preparar biscoitos para oferecer de cortesia aos colegas todas as manhãs.
Em Ted Lasso é evidente que o mundo está longe de ser perfeito, mas também está longe de ser uma ruína. Como já foi dito, o seriado Ted Lasso nos faz ver a viabilidade daquele “novo realismo” proposto por Rutger Bregman. E nesse sentido, não importa tanto descobrir se os seres humanos são essencialmente bons ou ruins.
Ted Lasso não nos dá essa resposta. A série apenas demonstra que é absolutamente possível construirmos formas de vidas comprometidas com a empatia. Esse compromisso não nos livrará da raiva ou das dores trazidas pela perda de um ente querido ou pela derrota de nossos clubes de coração. Esse compromisso não nos livrará do enfrentamento diário com nossos medos e traumas. Mas pode nos oferecer a oportunidade de entender que agir com empatia, solidariedade e optar pela alegria da coletividade também são ações absolutamente reais, verificáveis ao nosso redor e não somente ilusões.
Fonte da imagem: O Globo.
Talvez nesse aspecto resida parte dos motivos do sucesso de Ted Lasso junto ao público. Lançado na época da pandemia mundial de Covid, a série se transformou em um sucesso de público e de crítica especializada, chegando a ganhar o Emmy, em 2021 e 2022, de melhor série de comédia.
Em sites especializados e em resenhas críticas publicadas em jornais é comum lermos que uma das justificativas para o êxito de Ted Lasso é que a série nos trouxe leveza e humor em um momento tão delicado como foi o período pandêmico. O “novo realismo” de Ted Lasso fez sucesso.
Em sua terceira temporada, já lançada na metade do mês de março de 2023, a perspectiva positiva sobre a humanidade será colocada à prova, afinal a tomar pelo fim da 2ª temporada, estará em campo e fora dele, a inveja, a cobiça e a ingratidão.
Ted Lasso é uma série que nos faz refletir sobre profundas questões da nossa vida e o faz tendo o futebol como cenário e metáfora das nossas derrotas e vitórias diárias, sabendo sempre que amanhã o jogo continua.
Referências
BREGMAN, Rutger. Humanidade. Uma história otimista do homem. São Paulo: Planeta, 2021
LEVER, Janet. A loucura do futebol. Trad. A. B. Pinheiro de Lemos. Rio de Janeiro: Record, 1983.
[1] Bregman afirma que a “teoria do verniz” foi assim denominada pelo biólogo holandês Frans de Waal (p.21)
[2]Ted Lasso é uma série estadunidense original da Apple TV, criada em 2020 por Bill Lawrence e Jason Sudeikis.