Atualização sobre o mercado de transmissões de futebol no Brasil

2022 é um ano importante para o próximo ciclo de transmissão de eventos de futebol no Brasil. Libertadores e Sul-Americana começaram a ser negociadas; a Copa do Brasil e a Série C do Campeonato Brasileiro devem ser em breve, por estarem no último ano de contrato; além de as Séries A e B do Campeonato Brasileiro de futebol masculino também poderem ser.

Este texto serve como atualização da minha publicação neste Comunicação e Esporte (SANTOS, 2019a), em que ponderei especialmente sobre as plataformas pagas, algo que tratei naquele momento, para tratar da situação atual para estas disputas.

Fonte: TV História

Mudanças no cenário

Apontei há mais de dois anos a necessidade de aguardar como o mercado iria se estabelecer frente às novas possibilidades de exibição, partindo de análises da economia heterodoxa usadas pela Economia Política da Comunicação brasileira. Claro, não imaginava que uma pandemia iria acelerar certos processos e tornar o mercado de direitos de transmissão mais competitivo.

Na TV aberta, o Grupo Globo precisou se desfazer da transmissão da Libertadores e foi surpreendido com a aquisição pelo SBT para 2020, 2021 e 2022 – que ficou ainda com o ciclo trienal da Liga dos Campeões da Europa (2021-2022 a 2023-2024).

A Record TV adquiriu o Campeonato Carioca para 2021 e 2022, ainda que pagando pouco, mas surpreendeu ao ter o pacote TV aberta do Campeonato Paulista para 2022 a 2025. Enquanto a Band transmitiu a Copa do Mundo de Clubes FIFA 2021, com participação do Palmeiras e recorde de audiência, em fevereiro de 2022.

A “TV fechada” segue com assinaturas minguando, sendo melhor falar de “plataformas pagas de transmissão”. As empresas que atuam no setor, inclusive, passaram a priorizar seus serviços de streaming. O Grupo Disney (canais ESPN + Fox Sports 2) criou o Star+ em 2021, com vários torneios sendo adquiridos para lá. Enquanto a Warner Media criou o HBO Max, com início no Brasil também em 2021, com direitos exclusivos para essa plataforma – e migrando o conteúdo esportivo do Estádio TNT, antigo EI Plus, para lá.

Nos dois casos, representou um foco maior em plataformas ligadas a mais conteúdos, o que pode facilitar procedimentos de assinatura. Ou seja, no caso da Warner Media, não é preciso assinar o Estádio TNT para futebol e outra plataforma para filmes e séries. Também neste sentido que a Sky tem o DirecTVGo e a Claro tem assinaturas à parte para acesso via internet.

Além desses serviços oriundos de conglomerados internacionais históricos para transmissão de audiovisual, importante tratar da mudança de atuação do Facebook (Grupo Meta). Deixou de disputar os direitos de transmissão para ser parceiro de quem desejar usar a plataforma, ou seja, não é mais um agente de mercado relevante.

Em compensação, a Amazon, até pouco tempo um agente extra-mídia, passou a transmitir futebol no Prime Video, estabelecendo para 2022 uma parceria de sublicenciamento com o Grupo Globo para exibir a Copa do Brasil. Também plataforma da empresa, a Twitch vem sendo usada como plataforma para transmissão de influenciadores digitais de torneios como o Campeonato Carioca de 2022.

Ao mesmo tempo, o YouTube atua como parceiro e alguém que adquire direitos pontuais, sem entrar em grandes disputas. E um conjunto de outras plataformas como TV NSports, One Football e Eleven (antigo My Cujoo) atuam no que sobra de conteúdo, com a DAZN mantendo apenas aqueles conteúdos com contrato vigente para exibição no Brasil.

Assim, o cenário de disputas pode aparecer com três agentes dispostos a gastar em alguns direitos na TV aberta, Globo, Record e SBT; com a Band de olho em conteúdos que podem sobrar para apostas pontuais (como foi com o Mundial de Clubes e a Fórmula 1). Enquanto nas plataformas pagas, Disney e Warner Media vêm disputando tudo, com vitórias dos dois lados; mas com a Amazon devendo ser mais uma.

Fonte: print do Prime Video

Libertadores como referência

A CONMEBOL (Confederação Sul-Americana de Futebol), a partir da agência FC Diez, iniciou semanas atrás o processo para venda dos direitos de transmissão de seus torneios a partir de 2023. Espera-se uma competição dura pelos direitos com o cenário que apontamos para a disputa.

Dentre as novidades, há duas sinalizações: primeira opção de transmissão ser de plataformas pagas para metade dos jogos da primeira fase e a possibilidade de um mesmo agente adquirir direitos de exclusividade, ou seja, os dois pacotes em negociação (transmissão gratuita e paga) – ver Beting (2022) e Simon (2022).

Assim, a FC Diez aposta na disputa das plataformas pagas para ganhar mais no mercado brasileiro, que é responsável por mais da metade das receitas da entidade (BETING, 2022). Isso se justificaria porque não se espera um valor maior do que era pago pela Globo até romper o contrato em 2020, crescendo nos valores de transmissões pagas.

Se apontamos anos atrás os problemas da transmissão de quase todos os torneios mais importantes por apenas uma emissora na TV aberta (SANTOS, 2019b), que tinha muito controle sobre jogos a serem exibidos e no próprio formato disso, uma exclusividade de transmissão para plataforma paga pode ampliar problemas.

Primeiro que a escolha da Conmebol TV (pay-per-view disponível apenas em Claro, Sky e DirectvGo) praticamente fez sumir a Copa Sul-Americana nos últimos anos. A TV aberta é uma plataforma fundamental para transmissão de esporte no Brasil, como mostra o sucesso da escolha da Fórmula 1 pela Band mesmo com a ativação da F1TV no país em 2021.

Além disso, é preocupante para o público, considerando ser um torneio relevante no mercado local, que muitas pessoas buscam acompanhar ao vivo. Tratei dessa preocupação no texto anterior aqui no site: “A maior ‘oferta’ de canais para acompanhar futebol faz com que o torcedor tenha que ser assinante de diversas plataformas, o que, na soma, pode dar mais que o pacote básico da TV fechada” (SANTOS, 2019a).

Se os problemas econômicos acentuados pela pandemia afetaram grupos midiáticos, imagina a população brasileira, com alto índice de desemprego e sob efeito da consequência de reformas legais que flexibilizaram direitos trabalhistas.

Essa preocupação está no que apresentei na minha tese de doutorado, defendida em novembro de 2021 (SANTOS, 2021). É necessário garantir que partidas de interesse social relevante tenham acesso gratuito pela TV aberta, considerando os problemas de acesso à internet banda larga de qualidade e ao atraso desse tipo de transmissão.

Referências

BETING, Erick. Venda de Libertadores e Sul-Americana será definida no dia 4 de abril. Máquina do Esporte, São Paulo, 14 fev. 2022. Disponível em: https://maquinadoesporte.com.br/futebol/venda-de-libertadores-e-sul-americana-sera-definida-dia-4-de-abril. Acesso em: 19 fev. 2022.

SANTOS, Anderson David Gomes dos Santos. Os direitos de transmissão do Campeonato Brasileiro de Futebol. Curitiba: Appris, 2019. 2019b

SANTOS, Anderson David Gomes dos Santos. Um modelo para regulação dos direitos de transmissão de futebol. 2021. 461 f. Tese (Doutorado em Comunicação) – Programa de Pós-Graduação em Comunicação, Universidade de Brasília, Brasília, 2021. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/356969776_Um_modelo_para_regulacao_dos_direitos_de_transmissao_de_futebol. Acesso em: 19 fev. 2022.

SANTOS, Anderson. Qual o estágio das transmissões de futebol no Brasil? Comunicação e Esporte, Rio de Janeiro, 17 out. 2019. Disponível em: https://comunicacaoeesporte.com/2019/10/17/qual-o-estagio-das-transmissoes-de-futebol-no-brasil/. Acesso em: 19 fev. 2022. 2019a.

SIMON, Allan. CONMEBOL define PACOTES da LIBERTADORES. Sem TV? + TRANSMISSÕES DA RODADA. Blog do Allan Simon, 11 fev. 2022. Disponível em: https://youtu.be/PMbbgPMG1ec. Acesso em: 19 fev. 2022.

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