Jornalismo esportivo para os que praticam: reflexões

Você abre seu jornal pela manhã ou clica no site esportivo preferido em busca de notícias. Quer saber como está seu time, se contratou alguém. Ou então saber se determinado atleta garantiu a vaga olímpica. Ou verificar a tabela do campeonato estadual para checar e tentar adivinhar as futuras vitórias da sua equipe, certo?

Agora, já imaginou abrir o site esportivo predileto pela manhã e ler sobre as peladas mais disputadas no dia de natal? Ou então ler como é possível aprimorar sua técnica na batida de um escanteio ou na cortada de uma bola? Ou mesmo entender como se manter em forma para melhor movimentação dentro do campo de futebol na partidinha do fim de tarde com amigos? Ou naquela competição de basquete entre colegas do trabalho?

A questão principal que está por trás de tantas perguntas é entender se há espaço para produção esportiva focada numa espécie de “serviço” ao leitor, sendo este, mais do que apenas um torcedor, mas, também, um praticante de esporte. Teria ele interesse em ler sobre algo mais do que o factual relacionado à vida e à rotina de atletas e de equipes profissionais? Esses questionamentos surgiram a partir do trabalho jornalístico realizado na editoria de corrida de rua. Diversas pesquisas mostram que caminhar e correr são esportes dos mais praticados no Brasil. A famosa pelada, claro, normalmente lidera entre os homens. Mas corrida e caminhada são esportes simples, acessíveis, flexíveis, individuais (mesmo que também sejam realizados em grupos) e que permitem ao adulto manter-se saudável e esteticamente em forma.

Como o jornalismo esportivo ou, mesmo, será que cabe à editoria esportiva prover esse tipo de informação ao seu leitor / praticante? Sabe-se que inúmeros lugares, cidades, desse enorme país não há especialistas e nem informação suficiente para aqueles que querem praticar uma atividade física. Então, não seria também papel da imprensa atuar nessa área? Importante reforçar que parto do princípio de que a editoria esportiva é, sim, jornalismo, apesar de muito próxima ao entretenimento. E como entre as funções básicas do jornalista está prestar serviços de interesse público acredito que essa área da notícia da prática para o praticante pode ser um campo interessante a ser explorado.

Em tempo, se isso não acontece, ou pouco acontece, com os “grandes” esportes, como vôlei, futebol, basquete, na corrida essa prática jornalística já é mais comum. Somos um país em que pouco se lê e pouco se publica sobre esportes que não futebol, principalmente, os que não são de prática coletiva. Poucos leitores se interessam por nossos corredores profissionais e, portanto, e, além disso, muito deles praticam o próprio esporte. É aí que a prestação de serviço ganha espaço. Pode-se pensar também que existe uma grande proximidade dos benefícios da caminhada e da corrida com a editoria de saúde e temas relacionados ao bem-estar, inegavelmente, estão na moda. E antes que perguntem como separar joio do trigo, esporte e saúde, aviso que não sei a resposta. Mas aponto que essa área de prestação de serviço a quem pratica é algo interessante a ser explorado, principalmente ao se pensar na consolidação do jornalismo esportivo em épocas em que as maiores críticas à editoria são justamente da falta de seriedade e de desprezo pelo valor de importância da notícia.

Quem já trabalhou com esporte, mas em redação mista, isto é, no espaço onde há mistura da editoria esportiva com a geral, que cuida de política, economia e notícias da cidade, sabe o que é ser considerado pouco sério, praticamente irrelevante. E ver que as atenções só se voltam com ares mais respeitosos quando há um grande evento, como Copa e Olimpíadas, ou na final de campeonato de futebol. O esporte acaba sendo, de fato, utilizado para atrair a audiência. Diferentemente de uma matéria de serviço de cidade que tem como força maior seu valor de utilidade pública.

Pierre Bourdieu em seu texto “Como se pode ser esportivo?”, do livro Questões de Sociologia, fala justamente que é no surgimento do profissionalismo, isto é, na separação entre leigos e praticantes que a busca do “sensacional” e a exploração da dimensão espetacular do esporte ganham força. Aproximo essa ideia, em minha dissertação, ao papel da imprensa esportiva. Afinal, o principal mediador na contemporaneidade entre a prática esportiva e o público seria quem mais que os jornalistas? Pensar na produção editorial de notícias esportivas voltadas aos praticantes, e não mais aos somente torcedores, não é novo, mas foge um pouco desse modelo apenas voltado para a busca de sensações pelo leitor.

5 pensamentos sobre “Jornalismo esportivo para os que praticam: reflexões

  1. Muito pertinente o assunto. Ao ver os folhetins esportivos, parece-me que os autores estão mais interessados em fofocas e detalhes sobre alguns poucos elementos, do que sobre o esporte em geral. Se o leitor/consumidor estiver interessado em Hipismo ou pólo aquático, por exemplo, não encontrará quase nada na grande mídia. Além desse foco único, vemos que seria interessante se o veículo informa-se como se preparar fisicamente, (e, já que só falam de futebol),como dominar uma bola, como cabecear corretamente, as regras do esporte, etc. A professora Vera Toledo fala sobre esse assunto no artigo abaixo:

    “Se os profissionais destas duas áreas não se conscientizarem, restarão poucos praticantes da atividade esportiva e muitos telespectadores que participarão da atividade passivamente.”

    http://www.periodicos.ufsc.br/index.php/motrivivencia/article/view/5936/5448

  2. Carmelo, muito obrigada pela sugestão de leitura. Joaquim, não discordo de você, mas o post, especificamente, não se refere a um período específico, mas é uma reflexão para a editoria esportiva como um todo. Obrigada aos dois pelos comentários e reflexões. Luisa

  3. Acompanho (ainda que de forma muito tímida) a revista VO2 (dedicada ao ciclismo) e acho que eles fazem isso muito bem. Mas é a único exemplo que consigo citar de uma publicação que divide o espaço entre notícias e dicas de treinamento. Gostei do tema, já havia pensado sobre o assunto. Mas, sendo sincero, pseudo-atleta de fim de semana que sou, pouco me interessaria sobre uma proposta como esta de auxílio a treinamentos. Quero mesmo é saber dos olimpianos.

    1. Joo Paulo, compartilho desse seu pensamento. Eu tambm no sei se fora desse mundo de jornalista de corrida consumiria esse tipo de notcia. Tambm gosto de dar minhas passadas na rua, de forma amadora. Mas, de qualquer forma, revistas como a que voc citou e outras como Contra-Relgio e sites esto com essa proposta. Acho que a internet traz uma coisa a mais para esse “tipo de jornalismo” que a interao. Voc pode entrar na notcia, ver comentrios de outros, discutir questes e, principalmente, publicar no Face. Eu vejo que corredores fanticos que frequentam o Face propem com frequncia discusses com essas matrias como base. Obrigada pelo seu comentrio! = ) Bjs!

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